Relações Públicas e Gamification: Inovação nos relacionamentos internos organizacionais
Anderson Benites Lovato [1]
Marcela Guimarães e Silva[2]
Introdução
A atividade de
relações públicas é estratégica ao estabelecer relacionamentos entre as
organizações e seus públicos através de técnicas,
instrumentos e práticas de comunicação, tendo
competência para estruturar a comunicação organizacional, utilizando ações
capazes de potencializar a divulgação das informações e assegurar a presença da
organização no espaço público. Dessa forma, a atividade contribui para a
eficácia organizacional quando auxilia o entendimento e o alinhamento dos
objetivos da organização com as expectativas de seus públicos, e assume valor
para a organização ao colaborar para a eficácia e a construção de
relacionamentos de qualidade e de longo prazo com públicos estratégicos
(Grunig, Ferrari, & França, 2009). Assim, a atividade tem como objetivo
pragmático a busca por cooperação no sistema organização-públicos.
Diante dessa perspectiva,
e considerando-se, especificamente, o ambiente interno das organizações, as
relações públicas podem adotar processos inovadores, entre os quais a gamification, para a construção e
manutenção dos relacionamentos.
A gamification refere-se à utilização das ferramentas e mecanismos de
jogos com o objetivo de resolver questões práticas ou despertar engajamento em
um público específico. Frequentemente, esse conjunto de técnicas tem sido
utilizado por organizações de diversas áreas e segmentos como alternativas às abordagens
tradicionais, adotando funções que possibilitem encorajar pessoas a adotarem
determinados comportamentos e familiarizarem-se com novas tecnologias, agilizar
seus processos de aprendizado ou de treinamento e tornar mais agradáveis as
tarefas consideradas repetitivas.
A importância em se pensar sobre novos
modelos para motivar e engajar o público interno
ocorre a partir de uma realidade na qual esses colaboradores se veem, muitas
vezes, desmotivados e cheios de distrações. Assim, o objetivo deste estudo é refletir
sobre a gamification
como uma estratégia voltada às relações
públicas, visando potencializar a colaboração e promover a comunicação interna, a partir de uma pesquisa
bibliográfica para entender a gamification suas etapas e aplicação, bem
como sua aplicação enquanto uma estratégia de relações públicas.
Sobreas relações públicas e seus públicos
A atividade de relações
públicas surgiu por intermédio do jornalista e publicitário Ivy Lee, no final
do século XIX e início do século XX, nos Estados Unidos, na era da concentração
de riquezas em grandes monopólios. Diante das grandes manifestações populares
contra esse fato, no cenário norte-americano,
surgiu a necessidade de existir um profissional capaz de entender os públicos e
informá-los, e Ivy Lee passou a fazê-lo escrevendo artigos para jornais, na
condição de assessor de imprensa, mostrando uma nova forma de as empresas se
relacionarem com seus públicos. A ideia era de não usar a ação com a finalidade
de fazer propaganda da empresa, mas de pensar em estratégias para se relacionar
com os seus públicos.
Simões (1995), ao estudar as relações públicas no contexto das
organizações observa-as, inicialmente, como um processo, ou seja, um processo
de múltiplas dimensões de interação entre as organizações e seus públicos. Essa
interação é ampla e considera fatores internos e externos à organização, suas
causas e efeitos e todas as variáveis e tipos de relações, iniciadas tanto pela
organização quanto por seus públicos. Considerando-se a função de relacionamento
da organização com os seus públicos, também reconhecida por Simões (1995) pelo
termo relações públicas, precisa ser administrada com planejamento, para que
não seja concebido ao acaso, gerando surpresas no relacionamento entre
organização e público. A atividade de
relações públicas específica no sistema organizacional, possui a finalidade de
prever e controlar a função de relacionamento no agir das organizações (Simões,
1995).
Para conceituar relações
públicas deve-se partir da sua definição operacional, a qual oferece as
tradicionais etapas do exercício da profissão: diagnosticar a dinâmica no
sistema organização-públicos na conjuntura político-econômica, prever o que irá
acontecer nesse sistema, no curto e médio prazos, assessorar os líderes nas
políticas organizacionais, implantar programas de comunicação, e, por fim,
avaliar os resultados da intervenção no relacionamento organização-públicos
(Simões, 1995).
Para Fortes (2003, p. 21), “às Relações Públicas está reservado o
trabalho de conhecer e analisar os componentes do cenário estratégico de
atuação das empresas, com a finalidade de conciliar os diversos interesses”.
Nesse sentido, como objetivos principais das práticas de relações públicas destaca-se:
a busca pelo reconhecimento das organizações, seus produtos e serviços pelos
seus públicos, e a promoção da comunicação, interação e relacionamento entre
público e organização, de modo equilibrado e, às vezes, duradouro, e, com isso,
impulsionar o desenvolvimento organizacional.
Segundo Kunsch (2003), é possível destacar funções essenciais da
atividade: função administrativa, função estratégica, função mediadora e função
política, entendidas como a base para a gestão da comunicação organizacional.
Na função administrativa as relações públicas desenvolvem
atividades semelhantes às outras áreas que compõem a organização. É por meio
dessa função que se articulam todas as ações dentro da organização e entre os
setores. Na função estratégica a organização se posiciona diante da sociedade,
mostrando sua missão, visão e valores em que acreditam, com a finalidade de
criar uma identidade e para ser bem vista no futuro. Através dessa função são
abertos canais de comunicação a fim de a organização buscar credibilidade
diante de seus públicos, valorizando o que tem de melhor para fortalecer o seu
lado institucional. A função mediadora é uma das atividades de relações
públicas responsável por fazer a mediação entre a organização e seus diversos
públicos através dos meios de comunicação. Não é o caso de apenas informar, mas
sim comunicar para que haja uma troca de informações e reciprocidade. A função
política faz com que as relações públicas tenham ligações de poder na
organização e na administração de crises e conflitos. “Para o desempenho da
função política de relações públicas é fundamental compreender como se
processam as relações de poder no interior da organização e sua influência nas
relações com o ambiente externo” (Kunsch, 2003, p. 109).
Segundo Simões (1995), a
função política das relações públicas tem como objetivo legitimar as
organizações, ou seja, numa visão micropolítica as relações púbicas podem ser
identificadas por sua relação de poder entre uma organização e seus públicos.
Assim, a causa da existência da atividade de relações públicas está tanto na
sua relação entre organização e público quanto na probabilidade de ocorrer um
conflito entre ambos. “Trata-se do processo do sistema social (ou sociedade
específica) organização-públicos, inserido em processos de sociedades maiores,
isto é, a cidade, o Estado, o País e o mundo” (Simões, 1995, p. 45).
A
atividade busca esclarecer a todos dentro da empresa sobre seu papel e
responsabilidade junto à opinião pública, além de orientar e assessorar todas
as áreas da empresa no que diz respeito à forma mais adequada de conduzir suas
relações com os públicos. Em relação a sua função operacional: relações públicas é a gestão da função
organizacional política (Simões, 1995).
De acordo com França (2008), os públicos, principais envolvidos
nas estratégias de relações públicas, podem ser divididos em interno, externo e
misto. O público misto se
constitui de pessoas que não trabalham diretamente com a empresa, mas dependem
dela para realizar os seus negócios ― fornecedores, revendedores, acionistas e
prestadores de serviços ―, “é aquele que apresenta claras ligações socioeconômicas e
jurídicas com a empresa, mas não vivencia as rotinas da empresa, e não ocupa o
espaço físico da instituição” (França, 2008, p.114). O
público externo pode ser as pessoas ou entidades que recebem ou se beneficiam
dos bens e/ou serviços que a empresa oferece, mas não dependem diretamente da
empresa, nem financeiramente:
concorrentes, poder público, comunidade escolas, hospitais, bancos, sindicatos,
imprensa e seus consumidores ou clientes (França, 2008). O
público interno abrange todas as pessoas que trabalham dentro da organização,
as quais são afetadas diretamente por ela e colaboram para que a organização
possa funcionar de maneira a gerar lucro. Esse público pode ser assim definido:
os donos da organização, funcionários e seus familiares. França (2008, p.114) diz que público
interno “é aquele que apresenta claras ligações socioeconômicas e jurídicas com
a empresa onde trabalha, vivenciando suas rotinas e ocupando o espaço físico da
instituição”.
Andrade (1988) define o
público interno como “embaixadores da boa vontade”, reforçando que os clientes
de uma organização e a comunidade irão acreditar mais facilmente no que diz um
colaborador em relação à organização na qual trabalha do que em outras pessoas.
Esse colaborador é um importante multiplicador para a organização, diz Kunsch
(2003), e a esse público cabe uma comunicação mais consistente e contínua,
enfatizando a importância de uma comunicação mais realista e transparente.
Pode-se dizer, então, que
o público interno é estratégico para as organizações, e deve ser priorizado nos
processos de comunicação, merecendo um planejamento de comunicação que seja
capaz de atender aos seus anseios e necessidades de informação sobre a
organização, pois esse é um público multiplicador de informações e capaz de
gerar resultados facilmente mensuráveis desde que devidamente comprometido.
As transformações da sociedade incidem no ambiente organizacional
levando à mudança nos hábitos e comportamentos públicos, despertando a
necessidade de se criar métodos inovadores nos ambientes organizacionais.
Assim, novas
técnologias, técnicas e práticas passam a ser adotados nos processos de
relações públicas, pois as organizações tradicionais e hierarquizadas, baseadas no modelo
industrial de trabalho, com chefias autoritárias e conservadoras e
trabalhadores com uma rotina padronizada e pensamento limitado à execução de
tarefas, dão lugar a novas configurações de organizações abertas ao diálogo e à
colaboração. Assim, organizações investem em novas
formas de engajamento e fortalecimento dos relacionamentos internos, entre as
quais a gamification, considerada uma
estratégia lúdica de aprendizado capaz de fortalecer tal relação.
Noções
do processo de gamification
A importância crescente
que a “cultura gamer” vem desempenhando na sociedade, tem inegável impacto no
conceito de entretenimento, educação e treinamento. O game, como produto
cultural, é visto, enquanto mídia, sob diversas perspectivas: manifestação de
arte, nova forma de aprendizagem e até como o mais recente ícone da cultura
pop, o que só vem comprovar, cada vez mais, a notável influência e relevância
cultural dos games na contemporaneidade (Santaella, 2013).
A gamification surgiu como termo pela primeira vez por intermédio de
Nick Pelling, no ano de 2002, porém se popularizou, em 2010, a partir de uma
apresentação no TED de Jane McGonial.
“Gamification é um termo
em inglês, sem tradução ou equivalente imediato em português, que se refere ao
uso de jogos em atividades diferentes de entretenimento puro” (Vianna, Vianna,
Medina, & Tanaka 2013, p. 09).
Com o passar dos anos, outros autores buscaram definir gamification.
“É o uso de elementos e designs
dos jogos em contextos que não são lúdicos” (Werbach & Hunter, 2012, p.
26). Ainda segundo os autores, "é o processo de manipular a diversão para
servir aos objetivos do mundo real" (2012, p. 6). “A gamification
é o uso da mecânica baseada em jogos, estética e pensamento lúdico para
construir lealdade, motivar ações, promover aprendizagem e solucionar
problemas” (Kapp, 2012, p. 10). “É a aplicação de recursos dos jogos (design,
dinâmica, elementos e etc.), em contextos de não jogo para modificar o
comportamento dos indivíduos através de ações sobre sua motivação” (Teixes,
2014, p. 23).
Para Kevin Werbach (2012)
existem três categorias em que a gamification
agrega valor. A primeira é externa, se refere à organização na qual se está
inserido, basicamente com aplicações de gamification
voltadas aos consumidores em potencial. A segunda, interna, ocorre sobre
aplicações de gamification em pessoas
que já fazem parte da empresa, os colaboradores, por exemplo. A terceira categoria proposta por Werbach é
descrita como mudança de comportamento, em que se busca encorajar as pessoas a
participarem de algo que normalmente elas não o fariam. É engajar a
participação do público-alvo em relação a algo que precisa ser feito, mas há
dificuldade em superar alguns obstáculos. Desse modo, a gamification poderá dar a motivação necessária para mudar o
comportamento e tornar determinada prática um hábito, e mesmo que as pessoas já
saibam que algo precisa ser feito, a gamification
irá tornar mais satisfatório esse ato.
Motivar, gerar
cooperação, feedback imediato,
possibilidade de mensurações quantitativas e qualitativas, aprender fazendo e
com diversão são alguns dos objetivos da gamification.
Os jogos são boas ferramentas para estimular o pensamento sistêmico,
mostrando ao indivíduo que suas ações fazem parte de algo maior, o que é de
grande valor para o ensino e também para promover o entendimento de diversas
questões. Existe uma grande variedade de técnicas que podem ser usadas na gamification, todas ligadas por
princípios gerais do uso de elementos e técnicas de design de jogos para
resolver problemas que não são de jogos.
Os games são um formato moderno de organização das pessoas com a
finalidade de alcançar um objetivo. A estrutura e os modelos operacionais das
empresas ainda são os mesmos de décadas passadas, baseados na hierarquia, na burocracia
e na especialização do trabalho com o objetivo de alcançar escala e eficiência
dos resultados. Esse modelo exige funções e responsabilidades claramente
definidas, processos exatos e gerência baseada em comando e controle, assim
como se observa em organizações militares, porém no mundo moderno, esse modelo
limita a capacidade individual (Vianna et al., 2013).
Participar de um processo de gamification
não significa, necessariamente, jogar um jogo, mas apropriar-se de seus
aspectos mais eficientes, como a estética, mecânicas e dinâmicas. A aplicação
desse método envolve criação ou adaptação de uma experiência do usuário a
determinado produto, serviço ou processo, com o objetivo de despertar emoções
positivas, explorar talentos pessoais ou fornecer recompensas, sejam elas
físicas ou virtuais, ao cumprimento das tarefas estabelecidas no jogo. De
acordo com Huizinga (2000), o jogo é mais do que um fenômeno
fisiológico ou um reflexo psicológico.
No trabalho ou nas relações afetivas, quase sempre as regras são
confusas, as metas, indeterminadas, e a forma de alcançá-las, muitas vezes, é
desconhecida. As atividades não costumam receber feedback, as recompensas, quando existem, podem levar algum tempo
para vir. Nesse contexto, é compreensível que existam os jogos, pois eles
saciam de modo mais claro e com eficiência a busca pelo cumprimento dos
objetivos.
O conceito dos jogos é
uma forma moderna para as organizações inovarem nos relacionamentos, visando ao
alcance de um objetivo específico, pois os modelos operacionais da maioria das
empresas ainda são os mesmos do século XIX, baseados em hierarquia e burocracia
(Vianna et al., 2013). Essa forma de
trabalho dificulta, inclusive, o desenvolvimento da criatividade e transforma o
colaborador em um indivíduo estritamente operacional.
O
estudo da Lucent Technologies sobre satisfação no emprego reforça essa
afirmação, pois os resultados revelam que apenas 20% de 262 profissionais
afirmaram que os programas de treinamento formal da sua empresa atendiam suas
necessidades, ainda que cerca de três quartos (73%) tenham dito que sua
carreira exigia aprendizagem e crescimento. Isto é, os colaboradores sentem a
necessidade de aprendizado e conhecimento na organização, porém já não veem
mais sentido e resultado nos modelos tradicionais, em que apenas um fala e
outro escuta (Florida, 2011).
No entanto, aplicar um processo de gamification não se refere a reproduzir uma receita pronta, pois as
pessoas costumam se comportar de diferentes formas, e é necessário levar em
consideração diversos aspectos. Diferentemente do design de games voltados ao
propósito de entreter, a gamification
utiliza a mecânica dos jogos para transformar ou desenvolver novos
comportamentos.
A aplicação de uma bem-sucedida estratégia
de gamificação está diretamente associada ao entendimento do contexto em que se
insere o usuário, e quais são seus anseios e limitações extrínsecos (incitados
pelo meio externo) e intrínsecos (automotivados). (Chou apud Vianna et al., 2013,
p. 18)
Mas o que caracteriza um jogo como tal? McGonigal
(2012) resume o jogo com apenas quatro fatores comuns: meta, regras, sistema de
feedback e participação voluntária. Essa redução pode ser entendida não
como o desaparecimento dos outros fatores, mas como a transformação e a
ressignificação do conceito do termo jogo no contexto da pós-modernidade.
A meta é o fundamento que justifica a realização de determinada
atividade por parte dos jogadores, é o componente pelo qual os participantes de
um jogo concentram suas atenções para atingir os propósitos designados. E meta
não deve ser confundida com objetivo, pois a primeira ultrapassa a ideia de
conclusão de uma tarefa, é um propósito a ser perseguido pelo jogador, servindo
como uma orientação durante o jogo. As regras têm a função de definir a maneira
de o jogador se comportar e como irá organizar suas ações para cumprir os
desafios, e elas se ajustam à finalidade frente à complexidade do desafio para
estimular a criatividade e o pensamento estratégico. O feedback orienta e informa ao jogador como está seu desempenho
frente ao desafio proposto e sua interação com a atividade, o que também
contribui para a motivação à medida que o participante está ciente do seu
progresso. A última característica é a participação voluntária, em suma o
participante deve aceitar os três aspectos anteriores para que haja
harmonização no jogo proposto. (Vianna et al., 2013).
De acordo com Richard Bartle[3], passou-se a considerar que um amplo
conjunto de perfis poderia ser resumido em quatro grupos abrangentes de jogadores.
Predadores ou Killers são competitivos,
possuem comportamento agressivo e costumam provocar os adversários. Esse perfil
representa 1% dos jogadores. Conquistadores ou Achievers representam cerca de 10% dos
perfis dos jogadores. Caracterizam-se pela motivação ao
realizarem todas as atividades propostas, fazem uma imersão no seu contexto e
preferem se destacar dos seus oponentes pela lealdade e por seus próprios
méritos. Exploradores ou Explorers gostam
de desvendar todas as possibilidades e questionamentos do jogo. Para esse
perfil o mais importante é a trajetória e o aprendizado, e representam 10% dos
jogadores. E os Comunicadores ou Socializers são percebidos como aqueles que observam, através dos
jogos, uma oportunidade de socialização, considerando-a mais importante do que
atingir os objetivos, pois para eles, o jogo é a oportunidade de criar vínculos
sociais. Esse perfil representa o maior número de jogadores, totalizando 80% (Bartle, 2005).
Na concepção de Vianna et al. (2013), um bom elemento
de recompensas é primordial para desenvolver uma boa mecânica de jogo, e
representa o principal motivo pelo qual os jogadores irão se motivar a
permanecer jogando. Também há cinco ações passíveis de serem mencionadas como
formatos de recompensa que merecem atenção especial: status, acesso,
influência, brindes e giftings. Deve-se ressaltar também que o monitoramento de
métricas é de extrema importância, pois através dele os participantes saberão
se estão no caminho certo, sendo necessário um acompanhamento e aderência à
dinâmica desenvolvida, os quais irão oferecer dados fundamentais para a revisão
da estratégia adotada. “Adequar missões, monitorar a motivação dos jogadores e
mensurar as métricas por eles geradas são, portanto, as três iniciativas
indispensáveis à assertiva avaliação do grau de sucesso alcançado pela
proposição” (Vianna et al., 2013, p. 37).
A experiência da gamification é diretamente influenciada
pelo ambiente onde ela acontece. A iluminação, o som, o cheiro do espaço,
portanto, fazem parte do denominado por Huizinga (2000) de círculo mágico. O
autor sugere que, nesse mundo imaginário e temporário, as regras do jogo são
entendidas como uma descrição correta e adequada da realidade, que deve ser
aceita, voluntariamente, por todos os jogadores.
Fonte: Pinheiro & Zaggia, 2017,
p.81.
Assim, no círculo
mágico, as coisas ganham nova dimensão e um novo significado. Ao final da gamification, a percepção do sujeito
sobre o tema ali exposto será alterada pelas experiências recém-vivenciadas
nessa imersão. Assim, passa-se a enxergar novas maneiras de compreender e
solucionar os problemas ou temas propostos na gamification (Pinheiro & Zaggia, 2017).
Treinamentos, reuniões e outras atividades dessa natureza não
costumam ser as preferidas dos trabalhadores nas empresas, principalmente
quando não enxergam com clareza uma relação com a prática do seu cotidiano no
ambiente profissional. Por isso, motivar as pessoas a dedicarem seu tempo a
essas atividades se torna um desafio.
Possibilitar que tais iniciativas assumam contornos mais lúdicos através
dos elementos dos jogos poderá estimular uma competitividade positiva e, em consequência,
gerar comprometimento espontâneo no desempenho de tarefas repetitivas ou pouco
estimulantes ao intelecto (Vianna et al., 2013).
A gamification em Relações Públicas
A gamification,
nas relações públicas, pode ser inserida em suas práticas, entre as quais a
comunicação interna, que faz parte da comunicação organizacional. Esse tipo
de comunicação é dirigido a um público essencial para a organização, o interno,
que, informado, irá colaborar na disseminação do que se quer comunicar, além de
evitar rumores e conversas pelos corredores que, inúmeras vezes, podem ser
comentários negativos acerca de um assunto especifico. Esse público deve ser o
primeiro a ser informado, respeitando-se o fluxo de comunicação organizacional
de dentro para fora da organização.
Melhorar os processos de comunicação interna
implica melhores canais de comunicação, qualidade nas mensagens comunicadas e
eficácia na comunicação entre todos os departamentos da empresa. Com a
utilização da gamification possibilita-se
a melhoria nas interfaces e na disseminação de informações, para além de folhas
de papel e caneta, priorizando o compartilhamento, e, em diferentes tipos de
interações, também se possibilita uma compreensão facilitada de conteúdos mais
densos e técnicos.
Portanto, quando a gamification é realizada de forma correta, além de resultados
positivos nas áreas da empresa, também permite tornar o ambiente de trabalho
mais harmonioso e agradável para todos que constituem a empresa. Dentro da
organização a informação é passada para profissionais de diversos níveis, e a gamification pode possibilitar que a
compreensão seja igual para todos através de uma linguagem que atente para os
diferentes níveis hierárquicos no jogo.
Também pode-se utilizar a gamification com o objetivo de consolidar
a cultura da empresa diante do seu público, isso porque, atualmente, umas das
maiores preocupações das empresas é reduzir a rotação dos seus trabalhadores
mais qualificados, e reter talentos acaba sendo um problema para pequenas e
médias empresas. A alta rotatividade implica em diversas questões para as
empresas, uma delas é a perda de produtividade. A gamification pode ajudar, sobretudo, a aumentar o envolvimento dos
trabalhadores na empresa e, às vezes, também reduzir os custos de incorporação (Teixes, 2014).
No planejamento estratégico, as relações
públicas podem utilizar a gamification, pois,
na maioria das vezes, as empresas encontram dificuldades em alinhar um
entendimento de forma macro que irá se desdobrar em um conjunto de práticas a
serem realizadas por todos os colaboradores.
Para a solução desse problema aplica-se um jogo colaborativo, com metas
coletivas entre áreas e departamentos alinhadas à visão global da organização.
Assim, cada jogador precisa realizar tarefas para a conquista de pontos
individuais, mas que ajudarão sua área ou departamento.
Para a fidelização e consolidação da marca perante seus clientes, utiliza-se a gamification como forma de aumentar as vendas, e até aumentar o tráfego no site da organização e o tempo de permanência nestes, motivando o interesse pela descoberta do produto pelo mercado; obter dados de contato de futuros clientes, incentivando clientes e usuários fazerem feedback sobre os produtos e serviços da organização (Teixes, 2014).
A gamification também pode ser utilizada para eventos, tendo como
objetivo principal a criação de experiências inovadoras, criativas e
engajadoras aos seus participantes. Deve-se pensar,
inicialmente, sobre qual evento será realizado, podendo ser o lançamento de um
produto, workshop, palestra, feira entre outros. Os eventos
são instrumentos estratégicos na comunicação
organizacional, pois por trás de sua organização existe um objetivo que se
deseja alcançar. Um evento gamificado
possibilitará também uma diferenciação de outras marcas e um reforço para a
imagem institucional da organização em que o relações públicas estiver
realizando essa estratégia.
Em reuniões, a gamification poderá significar uma
melhora em questões como feedback,
que, na forma tradicional, ocorre uma vez ao ano, e às vezes não ocorre. Clarificar os objetivos da organização para
seus colaboradores, fornecer informações claras e com antecedência
possibilitará maior engajamento por parte dos membros da empresa, ao se
sentirem parte do processo de construção e alinhamento de informações, deixando
de ser algo imposto para ser algo participativo.
Nos treinamentos, a gamification
poderá possibilitar excelentes resultados, pois “desenvolver habilidades
humanas está na essência de qualquer jogo” (Pinheiro & Zaggia, 2017, p.
95). Muitas empresas, ao perceberem isso, passaram a investir na gamification como uma forma de
desenvolver seus colaboradores, a qual pode ser utilizada para desenvolvimento
de líderes, treinamento para determinado setor da empresa, motivação,
autoavaliação e saúde do colaborador.
Considerações Finais
Com
o crescimento da produção de conhecimento no campo de estudo das relações
públicas, novos elementos se mostram pertinentes, como oportunidade para a
profissão/atividade ser pensada de forma criativa nos processos de
relacionamento com os públicos. Além disso, na gestão dos relacionamentos
internos de uma organização as relações públicas devem estar atentas às
mudanças de comportamento e tendências para que seus métodos não se tornem
obsoletos.
Os
relacionamentos possuem uma necessidade de inovação na sua gestão, pois a forma
com que as pessoas se relacionam mudou, seus interesses e gostos também. Assim,
a gamification pode ser considerada
uma estratégia de relações públicas para as organizações, com o objetivo de
modificar o ambiente interno, estabelecendo uma nova forma de interação com seu
público, pois esta proporciona uma mudança na construção de relacionamento
entre uma organização e seus públicos. Além disso, a gamification pode ser um recurso para esses ambientes pelo fato de
ser um método inovador de aplicação de jogos em situações que não são de jogos,
visando resultados em produtividade, comprometimento de funcionários e
introdução de mudanças organizacionais, e também um estimulo à inovação. Tais
inovações possibilitam transformar a forma de trabalho em algo que antes era
vertical para algo horizontal e acessível a todos.
Talvez esse seja o futuro
das relações públicas, ou seja, pautar-se por atividades criativas e
inovadoras, levando em consideração os interesses dos públicos e da
organização, por meio do equilíbrio das suas relações e de estratégias que
gerem engajamento de ambas as partes.
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[2] Pós-doutora
em Comunicação e Gestão de Indústrias Criativas pela Faculdade de Letras (FLUP)
da Universidade do Porto - Portugal. Professora do Programa de Pós-Graduação em
Comunicação e Indústria Criativa e do curso de Relações Públicas da
Universidade Federal do Pampa - Unipampa, campus São Borja, RS -
Brasil. Líder do GP Processos e Práticas nas Atividades Criativas e
Culturais (CNPq/Unipampa). Coordenadora do Observatório Missioneiro de
Atividades Criativas e Culturais (OMiCult). E-mail:
marcelasilva@unipampa.edu.br
[3] Professor e
pesquisador de jogos britânico, conhecido por ter sido o criador do primeiro
MUD, MUD1, e autor de um livro seminal sobre criação de jogos, Designing
Virtual Worlds.
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